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Trabalhador PJ fica sem benefício e sem auxílio emergencial na crise

Programas do governo excluem profissionais contratados como prestadores de serviços; saída é negociar com empresa

SÃO PAULO
Para quem trabalha com carteira assinada, há o benefício emergencial. Ao informal o governo concedeu um auxílio de R$ 600 que será pago por três meses –o primeiro já foi depositado.

Há, no entanto, um parcela de trabalhadores que não terão direito a nenhum dos dois benefícios. São os trabalhadores pessoa jurídica que prestam serviços a empresas como se fossem funcionários, os chamados PJs.

Se as empresas para as quais trabalham decidirem cortar jornada de trabalho e salário ou mesmo suspender os contratos, eles não terão o direito ao benefício calculado com base no seguro-desemprego, criado pelo governo Jair Bolsonaro na medida provisória 936, de 1º de abril.

Na produtora em que o editor de vídeos Fabio Procópio, 47, trabalha, a redução adotada foi a de 25%.

​Com isso, ele passou a trabalhar um dia a menos por semana e, ao fim do mês, receberá menos também.

A nova rotina inclui ser o único a ainda frequentar os local de trabalho. Os demais colegas seguem na ativa, mas em suas casas. O complemento de 25% do valor do seguro-desemprego a que os trabalhadores com carteira assinada terão direito não chegará a Procópio, que é PJ.

Para compensar a perda na renda e manter o orçamento em dia, ele decidiu colocar à venda parte de sua coleção de livros e histórias em quadrinhos. A loja online vai bem, ele conta, e está rendendo mais do que eventuais trabalhos como freelancer.

O benefício, afirma Procópio, foi duplo, pois a venda ajudará no equilíbrio das despesas a serem pagas e ainda abre espaço em casa, uma vez que a esposa está em regime de teletrabalho, o home office.

MEDIDAS NA CRISE DO CORONAVÍRUS

Trabalhador com carteira assinada

  • Quem ganha até R$ 3.135 pode ter redução de salário e jornada por acordo individual
  • Haverá um benefício emergencial
  • Quem tiver redução de 25% no salário terá o mesmo percentual do seguro-desemprego a que teria direito
  • Se empresa suspender o contrato, o benefício será igual ao seguro-desemprego nas empresas do Simples Nacional; o valor máximo é de R$ 1.813

Informais e autônomos

  • Três parcelas de um auxílio de R$ 600
  • Mães que chefiam a família têm direito a duas cotas
  • MEIs que não estejam trabalhando também recebem

O advogado Luiz Antonio dos Santos Júnior, sócio da área trabalhista do Veirano Advogados, diz que, em algumas situações, esses profissionais até se enquadrariam nos requisitos para o recebimento do auxílio emergencial.

O benefício de R$ 600 pode ser pago para quem é MEI (Microempreendedor Individual), por exemplo, desde que o rendimento tributável, em 2018, não tenha sido maior do que R$ 28.559,70.

Na semana passada, o Senado aprovou a ampliação do benefício emergencial e retirou esse limite. A mudança, porém, ainda precisa ser sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro para começar a valer.

Outros requisitos continuarão valendo, como a renda máxima de até R$ 3.135 por grupo familiar ou de até R$ 522,50 por pessoa na família.

A limitação da renda é um dos impedimentos. O outro, diz o advogado, é o fato de esses profissionais continuarem trabalhando. “O cruzamento de dados acabaria acusando que os recolhimentos [de impostos] estavam mantidos.”

É o caso da arquiteta Marina (nome trocado a pedido da entrevistada), que atua como MEI, mas trabalha como funcionária de um escritório.

Pelo trabalho de segunda à sexta e por oito horas diárias, ela emite notas de prestação de serviços. Recebe por fora benefícios obrigatórios aos contratos feitos sob as regras da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), como férias remuneradas e 13º salário, além de uma valor correspondente ao vale-refeição.

No início de abril, Marina foi informada de que, das oito horas diárias, atualmente cumpridas em regime de teletrabalho, ela passaria a trabalhar somente seis. Como recebe por hora, já sabe que a renda mensal cairá. “Como estou em casa e continuo recebendo o valor do vale-refeição, isso está ajudando bastante.”

Para Santos Júnior, nos casos em que empregados estão travestidos de pessoas jurídicas, o que resta ao trabalhador é buscar uma negociação com o empregador.

“Quando ele é, de fato, pessoa jurídica, fica sujeito à rescisão integral dos contratos já assinados, situação em que também está totalmente excluído das MPs emergenciais publicadas pelo governo.”

A adoção da “pejotização” pelas empresas ocorre porque o modelo tem menos encargos para quem contrata, que fica livre do recolhimento da contribuição previdenciária (20% do valor do salário) e de FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), por exemplo. Esses recolhimentos fazem falta ao trabalhador em situações como em uma demissão.

Quando é sem justa causa, dá direito a uma multa de 40% do saldo do Fundo de Garantia. As contribuições ao INSS, além de necessárias à aposentadoria pela Previdência Social, dão direito ao benefício por incapacidade, caso o trabalhador fique doente ou sofra um acidente.

O advogado Cristóvão Macedo Soares, sócio do Bosisio Advogados, diz que, se a prestação de serviços for fraudulenta e houver a possibilidade de comprovar a existência da relação de emprego, o trabalhador poderá ir à Justiça buscar reparação.

No trimestre encerrado em fevereiro, o Brasil tinha 24,4 milhões de trabalhadores por conta própria, que incluem os autônomos formais e informais. Entre os que são empregadores, o número estava em 6 milhões, segundo a Pnad Contínua, pesquisa realizada pelo IBGE.”‹

Em meio à crise econômica do coronavírus, o Comitê Gestor do Simples Nacional prorrogou o vencimento dos impostos de abril, maio e junho, que ficaram para outubro, novembro e dezembro deste ano.

A medida vale também para quem é MEI –o recolhimento do ISS, imposto municipal exigido dos prestadores de serviços, foi postergado pro seis meses.

Fonte: Folha de São Paulo, por Fernanda Brigatti, 26.04.2020