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Compliance trabalhista: uma ferramenta para a mitigação de riscos

A Reforma Trabalhista havida em 2017, através das Leis 13.429/17 e 13.467/17, deu início ao encerramento de uma antiga discussão travada na Justiça do Trabalho ao inserir e alterar os artigos 4º-A e 5º-A da Lei 6.019/74, positivando a permissão da terceirização, inclusive das ditas “atividades-fim” das empresas.

A alteração legislativa contraria o que preceitua a súmula nº. 331 do C. TST, que era, até então, a única regulamentação existente a respeito, e segundo a qual não era permitida a terceirização das atividades-fim ou principais da empresa.

A palavra final sobre o tema foi dada pelo Supremo Tribunal Federal em agosto de 2018, por ocasião do julgamento da ADPF 324 e do Recurso Extraordinário em Repercussão Geral 958252, que versavam sobre a possibilidade de terceirização em todas as atividades da empresa. O tribunal entendeu ser lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo, remanescendo a responsabilidade subsidiária para a hipótese de inadimplemento das obrigações pela contratada.

Passados mais de dois anos de vigência da Reforma Trabalhista, o que se observa é que o novo comando legal, ao contrário do que foi suscitado pela maioria de seus críticos, não representou, na prática, um permissivo à terceirização em massa das atividades empresariais e à precarização da mão de obra.

Uma possível razão é que, se por um lado os artigos 4º-A e 5º-A autorizam expressamente a terceirização independentemente da atividade, por outro, o mesmo artigo 5º-A, em seus parágrafos, bem como o artigo 4º-C da Lei 6.019/74 estabelecem uma série de obrigações da contratante, ampliando suas responsabilidades como tomadora de serviços.

A imposição dessas obrigações não passou despercebida pelos órgãos de fiscalização do trabalho e diversos tem sido os autos de infração capitulados nos dispositivos acima, assim como a instauração de inquéritos civis pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), estes últimos com foco em aferir a efetividade das ferramentas de fiscalização utilizadas pelos tomadores de serviço com relação aos seus prestadores.

Na Justiça do Trabalho já há entendimentos no sentido de infligir às empresas contratantes um dever de fiscalizar muito mais amplo e até mesmo a obrigação de garantir o cumprimento de obrigações legais e normativas, especialmente no que se refere às questões de saúde e segurança do trabalho.

Pois bem. Nesse cenário, as organizações que melhor tem enfrentado a questão, seja frente às fiscalizações do trabalho e investigações do MPT, seja nos autos de uma demanda judicial, são aquelas que possuem boa gestão de seus contratos de terceirização e são capazes de demonstrar os controles realizados.

Por sua vez, essa gestão eficiente dos contratos de prestação de serviços está ligada, na maioria das vezes, à existência de um programa de compliance, com uma frente voltada às questões laborais, o que se denomina compliance trabalhista.

O compliance trabalhista tem por escopo estabelecer na empresa um programa voltado à observância de normas relativas às relações de trabalho, o que envolve diversos aspectos, tais como admissão de empregados, gestão de pessoas, normas de saúde e segurança do trabalho, bem como terceirização de serviços.

Na hipótese de terceirização, é fundamental a fiscalização das empresas prestadoras de serviços para assegurar o respeito às leis trabalhistas e demais normas aplicáveis, evitando implicações jurídicas à tomadora de serviços. Nesse viés, o sistema de compliance adotado deve prever instrumentos para efetuar uma fiscalização eficiente das prestadoras de serviços, sendo importante destacar que todo e qualquer mecanismo de controle deve ser documentado para dar respaldo futuro à empresa contratante.

Uma prática comum nas empresas que realizam essa gestão é a exigência de apresentação mensal de documentos que comprovem a regularidade do adimplemento das verbas e demais obrigações trabalhistas devidas aos empregados terceirizados

Ademais, é ideal que o processo de due diligence seja renovado periodicamente durante a relação comercial com o terceiro, devendo-se incluir nos contratos de prestação de serviços, para tanto, cláusulas que viabilizem a realização deste processo de investigação.

Com a adoção de tais medidas, inerentes ao compliance, a empresa mitiga os riscos do negócio pactuado, não só por ser capaz de demonstrar que cumpre o seu dever de fiscalizar, bem como por ter a possibilidade de se antecipar a problemas futuros decorrentes de responsabilidade subsidiária, caso a contratada se mostre insolvente.

Para além do passivo trabalhista, o compliance reduz o risco de lesão a um ativo de suma importância, que é a imagem da organização perante o mercado. Por derradeiro, convém destacar que a definição de um bom modelo de gestão de contratos de terceirização depende das peculiaridades do contrato pactuado, razão pela qual é fundamental que o compliance trabalhista esteja alicerçado uma consultoria jurídica especializada.

Fonte: Analise, por Ana Gabriela Primon, sócia do Granadeiro Guimarães Advogados, 22.06.2020

Vendedora que recebia beijo e beliscão de gerente será indenizada

Mesmo disponibilizando canal de denúncias, empresa teve responsabilidade reconhecida no caso.

A 1ª câmara do TRT da 12ª região manteve a condenação, imposta em 1º grau, a rede de varejo em caso de assédio sexual envolvendo vendedora. Para a relatora, o fato de a empresa possuir um canal de denúncias atenua a gravidade de sua culpa, devendo ser reconhecida sua responsabilidade.

A funcionária alegou que o supervisor costumava fazer comentários de natureza sexual e usar sua função para tocar nas empregadas. Segundo testemunhas, “havia abraços, apertões e beijos desnecessários”, e quando elas reclamavam, o supervisor dizia estar apenas brincando.

Em 1ª instância, o juiz do Trabalho Charles Baschirotto Felisbino, da 2ª vara de São José/SC, condenou a loja a pagar uma indenização de R$ 15 mil à empregada por dano moral. Segundo o magistrado, “não se pode aceitar que num ambiente de trabalho ocorra desrespeito à intimidade dos empregados”.

No recurso, a varejista argumentou que desconhecia a situação narrada pela autora e alegou que oferece um canal de comunicação direta aos empregados para denúncias de assédio. Solicitou, então, que a indenização fosse reduzida.

Ao julgar o recurso, a 1ª câmara do TRT decidiu, por maioria, manter o valor da condenação. Segundo a juíza do Trabalho convocada Maria Beatriz, relatora, o fato de a empresa possuir um canal para denúncias atenua a gravidade de sua culpa, no entanto, não afasta sua responsabilidade. “Essa medida se revelou ineficaz, pois, do contrário, a reclamante e outras empregadas não teriam sofrido assédio.”

Em seu voto, a magistrada ressaltou que o assédio sexual pode se desenvolver de diversas formas, desde chantagens diretas de superiores até a prática constante de piadas e incitações sexuais inoportunas por colegas — o chamado assédio sexual ambiental.

Fonte: Migalhas, 04.02.2020